Jogador Número 1 - Spielberg volta à sua melhor forma
"A comunicação é a chave do sucesso". Esta frase, derivada de uma célebre citação do autor americano Paul J. Meyer, esteve muito presente em minha vida durante um ano, e foi nela que pensei durante toda a exibição do novo filme do maior diretor de blockbusters da história, Steven Spielberg (que dispensa apresentações), "Jogador Número 1".
Em 2045, a civilização humana se tornou um lugar difícil para muitos, já que houve um forte aumento na desigualdade social. Para isso, foi criado por James Halliday, um programador introvertido, todo um universo virtual para onde as pessoas fugiriam da dura realidade. Com sua morte, são propostos três desafios para os usuários desta rede, a OASIS, e o primeiro que cumprisse os três seria o novo dono da mesma e o jovem da periferia de Columbus, Wade, é um dos vários que estão atrás da recompensa.
Voltando para a citação de Meyer. Apesar do filme, assim como o livro homônimo no qual o longa foi baseado, falar sobre uma realidade virtual, um campo muitas vezes associado ao isolamento e anonimato, a lição que o filme gostaria de passar é justamente a de que o ser humano está cada vez mais longe da realidade e que é preciso que a interação face-a-face volte a ser algo mais comum antes que a imersão completa em um mundo virtual se torne irreversível.
Como sempre, eu inicio a minha análise a partir dos aspectos visuais. Se eu tivesse que descrever todo o longa com uma só palavra, esta seria "estonteante". Assim como em "Uma Aventura Lego", este filme possui uma alta variedade de fan service da cultura pop. Considerando que a maior parte do filme é CGI e animação 3D, a pós-produção está de parabéns por conseguir, de começo ao fim, dar um aspecto orgânico aos personagens sem cair para um lado mais mecânico ou "fantochoso" (neologismo compreensível este). A direção de fotografia também é sensacional. Uma das primeiras sequências do filme é uma corrida. Esta que poderia cair na galhofa que está presente em toda a filmografia do Michael Bay de excessivos jump cuts e giros irritantemente nauseantes, mas toma um rumo com uma dinâmica mais suave que você olha e, segundo o Tiago Belotti, percebe que "Speed Racer" das Irmãs Wachowski poderia muito bem ter sido filmado daquela forma ao invés do caos epilético que o longa de 2005 se mostrou. Ainda assim, existem dois planos que usam uma espécie de "efeito Vertigo" de uma forma muito estranho que quando eu vi não deu para assimilar o que tinha acontecido.
O som também é um aspecto que merece ser elogiado. Caso você é aquela pessoa que acha que uma exibição em uma dessas salas XD com sistema de som sorrounding e 3D é perda de dinheiro ou apenas está em dúvida qual seria a melhor forma de assistir este filme, experimente vê-lo na melhor sala disponível. Pois tanto a edição de som, que recria com maestria efeitos sonoros nostálgicos, quanto a mixagem de som que põe no lugar os mesmos com uma sincronia absurda, são um dos maiores méritos do filme. Assim como a trilha original do Alan Silvestri que traz alguns traços sutis da obra do John Williams (inclusive de Star Wars que, teoricamente, não teria os direitos autorais para usar elementos da mesma) e as músicas características das décadas de 80 e 90, pegando carona com a popularidade das mesmas junto com "Stranger Things", "It - A Coisa" e "Guardiões da Galáxia".
Eu não sou capaz de opinar se o filme é ou não uma boa adaptação. Mas para um filme de seu gênero, seu roteiro é tudo menos preguiçoso. Tudo bem que o filme deixa em aberto algumas perguntas como "Por que o mundo está tão inóspito". Todos os personagens são bem desenvolvidos e fazem nos importarmos com eles. Principalmente o grupo dos "cinco do topo", que são os protagonistas. Isto porque estes são incríveis e ainda assim constantemente correm perigo dentro e fora da OASIS. Sinal de que é mantido um tom bacana de tensão durante os três atos. Isso sem contar dos diálogos engraçados e inteligentes que fazem tudo parecer melhor.
As atuações também não ficam para trás. Tye Sheridan se consolida aqui como um dos atores mais promissores de sua geração apesar de já ter apresentado um indiscutível talento em "Mud" de 2013. Mesmo sua escolha de casting ter sido polêmico por não cumprir às características do personagem do livro, como um visível sobrepeso. Olivia Cooke também está muito bem, apesar de sua personagem aparecer mais na OASIS do que no mundo real. Lena Waithe está sensacional. Até mesmo quando não vemos seu rosto ela consegue transmitir uma boa comicidade, como na cena do "O Iluminado", que para mim é uma das cenas mais bem dirigidas de toda a carreira do Spielberg. Philip Zhao também está engraçado e o Wim Morisaki é apenas badass. Já Ben Mendelsohn, que eu já havia elogiado em "O Destino de Uma Nação", faz um antagonista psicopata e esperto que é capaz de tudo para alcançar seu objetivo. Mark Rylance e Simon Pegg fazempapéis pequeno e não muito semelhantes, talvez até antitéticos, mas sem dúvida importantes para a narrativa. Por fim, temos Hannah John-Kamen fazendo a funcionária leal de Nolan Sorrento, o antagonista vivido por Mendelsohn, Zandor, que me lembrou a apática replicante Luv de "Blade Runner 2049".
"Jogador Número 1" é um dos raros casos de filmes que você pode assistir hypado pois definitivamente não irá te decepcionar. Possui incontáveis easter eggs e referências de cultura pop que ativarão aquele senso de nostalgia das décadas de 80 e 90. Além disso, tem um roteiro inteligente e engraçado (e que estas virtudes se tornam mais evidentes com as boas atuações de um elenco bem escalado), com uma mensagem relevante e claras sobre as relações humanas que vêm se perdendo e que, acreditem ou não, não se auto-sabota no final como os últimos filmes do diretor. Possui uma ou outra falha técnica que, de forma alguma, diminui a experiência. Fazer o quê? É Spielberg voltando a fazer "Sessão da Tarde". Nota 10.
"Jogador Número 1" é um dos raros casos de filmes que você pode assistir hypado pois definitivamente não irá te decepcionar. Possui incontáveis easter eggs e referências de cultura pop que ativarão aquele senso de nostalgia das décadas de 80 e 90. Além disso, tem um roteiro inteligente e engraçado (e que estas virtudes se tornam mais evidentes com as boas atuações de um elenco bem escalado), com uma mensagem relevante e claras sobre as relações humanas que vêm se perdendo e que, acreditem ou não, não se auto-sabota no final como os últimos filmes do diretor. Possui uma ou outra falha técnica que, de forma alguma, diminui a experiência. Fazer o quê? É Spielberg voltando a fazer "Sessão da Tarde". Nota 10.