Stardust - Contornos históricos a uma mise-en-scène incompleta
A justa intervenção do filho do Bowie nessa biopic do pai, proibindo o uso de suas músicas, claramente levou a produção de "Stardust" a levar caminhos alternativos ao anteriormente previsto. O resultado, uma cobertura do período mais medíocre da carreira do artista mais completo do século passado, revela como desvios drásticos na linha do tempo da figura retratada pode provocar incompletude à mise-en-scène construída.
O filme, que se passa no período de lançamento do 3º álbum do Bowie, "The Man Who Sold the World", acompanha sua turnê fracassada nos EUA e a dificuldade encontrada em fazer o público estadunidense aceitar seu estilo ao mesmo tempo em que ainda procura desenvolver uma face artística madura. Dito isso, nota-se como os 3 atos, de certa forma, são executados simultaneamente através de transições temporais arbitrárias ao processo coesivo do enredo.
Se, por um lado, o espectador encara uma montagem que possa desafiar seu senso de continuidade, essa irregularidade proposital falha na sua tentativa de dialogar bem com o estado mental com que o protagonista é induzido pela rejeição à sua arte a partir do momento em que o filme decide suspender essa decisão e substituir a fragmentação temporal por elementos específicos anteriormente citados pelos personagens. O espelho, por exemplo, eventualmente mencionado como um portal para o artista enxergar além de si mesmo a imagem que busca passar ao público, se torna cada vez mais presente após passados os primeiros 50 minutos, ainda que seja um artifício interessante para a noção de profundidade trabalhada no filme.
Nota-se aqui, inclusive, uma priorização na noção de profundidade, que é muito bem articulada à paranoia sofrida pelo Bowie em função de seu fracasso e do histórico de esquizofrenia em sua família que também parece começar a afetá-lo, além de colaborar na transposição de fatos biográficos do artista forçadas pela intervenção de Duncan, como o próprio período de seu nascimento, que na verdade corresponde à época de produção do álbum em questão. Porém, isso leva à negligência de outros elementos da mise-en-scène, gerando uma impressão de incompletude na composição imagética do longa.
Com isso, nenhum personagem coadjuvante é verdadeiramente desenvolvido e nenhuma das causas dos episódios de terror psicológico que consomem o artista se projeta como legítimas ameaças. Em suma, toda a análise anterior e o gênero de "road movie" com o qual o filme se identifica o torna num "Green Book" genérico no qual o racismo é substituído pela incompetência da Mercury Records e o complexo de "white savior" é substituído pela criação de Ziggy Stardust. 5/10.
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