sábado, 11 de agosto de 2018

Mentes Sombrias - Comentário

Mentes Sombrias - Comentário

Resultado de imagem para mentes sombrias
   Desde que o plot do futuro distópico em que o restante da sociedade está nas mãos de jovens se popularizou com "Jogos Vorazes", diversas franquias tentaram, e conseguiram, inovar esse subgênero de ficção científica. Acontece que a medida que ele foi sendo dissecado mais difícil era reinventá-lo; apesar do entretenimento na forma mais pura ser o objetivo maior a ser alcançado, era preciso bater a qualidade técnica e narrativa atingida pelos três últimos filmes da franquia americana, conduzidos por Francis Lawrence. Infelizmente muitos não puderam perceber isso, como é o caso de "Mentes Sombrias".
   A jornada de Ruby, uma das sobreviventes de uma doença que dizimou a população infantil norte-americana e deu aos que sobreviveram super poderes, a algum lugar seguro para ela e seus amigos, ameaçados por adultos, foi produzida pelo mesmo grupo responsável por "Stranger Things" e "A Chegada". Mesmo assim, apesar da produção prometer um grande longa, o resultado veio em forma de um decepcionante melodrama adolescente com alguns elementos de "X-Men: Primeira Classe".
   Com diálogos rasos sobre superação em equipe, inúmeros coadjuvantes unidimensionais (salvo o personagem interpretado pelo Patrick Gibson) e plot twists previsíveis, o longa não só não nos oferece nada de novo em relação ao subgênero como também peca em lugares normalmente fáceis de serem trabalhados. Apesar de tentarem contornar a situação com sete minutos adicionais no terceiro ato, o que foi desnecessário se levado em conta que mesmo assim os erros não conseguiram ser amenizados, seguido de uma narração final da protagonista, esta que, por sua vez, foi infinitamente mais eficiente do que a tentativa de compensar seus defeitos.


Resultado de imagem para mentes sombrias
   Desta forma, restaram somente os efeitos visuais e o carisma dos protagonistas (dando destaque para o alívio cômico que Skylan Brooks consegue equilibrar junto a carga dramática que seu personagem precisa) para salvar o filme de um desastre completo. "Mentes Sombrias" não é o pior filme do ano, ele nos oferece boas atuações e uma qualidade técnica razoável, mas havia muito que ser trabalhado no campo narrativo. 4/10

sábado, 4 de agosto de 2018

First Reformed

First Reformed

Image result for first reformed
   Paul Schrader, por ser mais agraciado como roteirista (através inúmeras colaborações com Scorcese, como "Taxi Driver", "Touro Indomável" e "A Última Tentação de Cristo") do que como diretor ("Gigolô Americano", "Temporada de Caça" e "O Acompanhante"), nunca havia me achado tanta atenção atrás das câmeras, mas quando eu vi que o nome dele na lista de vencedores do Festival de Veneza do ano passado fui atrás de assistir a First Reformed o mais rápido possível.
   O longa que estrela Ethan Hawke e Amanda Seyfried, e retrata o desespero de um pastor calvinista de uma pequena congregação do norte de Nova Iorque em função da morte de um ambientalista, (passeando dentro de temas complexos como o extremismo contido na mente dos millenials, hipocrisia dentro da igreja e, é claro, fé), não só é um ótimo filme como também um dos mais completos e diferentes do ano até então.
   É de praxe, entre os diretores da geração de Schrader, estabelecer o tom do filme logo no plano de abertura. Com um lento fade-in do ambiente composto de cores neutras que envolve a igreja, podendo-se notar um close na fachada branca da First Reformed quando a imagem já está mais nítida, acompanhado por sons cacofônicos da natureza desde o crocitar de um corvo até a fadiga humana, Schrader busca mostrar que esse filme não é dos mais convidativos, mesmo que aos poucos o longa ofereça ao espectador uma boa recompensa no final.
   Recompensa essa que, para muitos, não virá, levando em conta a infinidade de interpretações que o final aberto oferece. Final aberto, inclusive, que é apenas uma das várias referências à grande influência de Schrader pra esse filme, o minimalista francês Robert Bresson. Para se ter uma ideia o plot de First Reformed é inteiramente baseado no título de um filme do francês, "Diary of a Country Priest". Ainda assim, Bresson não é a única grande personalidade do cinema que é ressuscitada no longa; Há muito de Travis Bickle, personagem de "Taxi Driver" que Schrader escreveu em 75, no reverendo Toller, vivido por Ethan Hawke. Desde a clara busca do "para onde apontar" de suas bússolas morais, passando pela solidão por opção, até os traumas vividos no dia-a-dia que os deixaram tanto inabaláveis quanto niilistas convictos em relação à humanidade, o que atinge seu clímax no mais recente trabalho de Schrader durante a mudança das imagens mostradas no chroma key da cena do "Magical Mystery Tour".
Related image
   A mise-en-scène, por sua vez, sempre busca mostrar o padre como alguém ordinário, às vezes até inferior, em relação aos outros usando a iluminação, por exemplo, para deixar seu personagem sob as sombras de seu superior. O posicionamento da câmera também se mostra relevante em busca de transmitir essa imagem, como com plongées perpendiculares em relação ao chão, dando a impressão que ele está sendo assistido por cima. Ethan Hawke também colabora ao trazer ao máximo a apatia necessária para seu personagem durante o primeiro ato para então, no segundo, se esforçar em investigar algo que, com uma tragédia inesperada, ficou sem explicação.
   Com o segundo ato se iniciam os questionamentos religiosos do filme. "Deus nos perdoaria pelo que fazemos com sua criação", "Se esse é o seu plano, por que ele gostaria de fazer isso?" e "Se Jesus tomou para si os nossos sofrimentos, por que ele nos permite sofrer mesmo quando sempre damos a outra face?" são os mais identificáveis ao longo do segundo ato. Além disso, pelo menos com o arco do Toller, começa a bater de frente a noção sociopata do human of late capitalism que o oprimiu há tanto tempo, já que agora ele percebe que tudo é efêmero, principalmente com o ser humano acelerando o prazo de validade de sua existência, o que o diretor busca saturar com o personagem do Ed Balq.
   Até este momento o filme demonstra ser ultrarrealista, mas com a tomada psicodélica do "Magical Mystery Tour" eu, pessoalmente, comecei a encarar o filme como alegórico. Quem sabe, até tentando dialogar com "MÃE!" do Aronofsky, considerando que pode-se traçar um paralelo entre a ação da humanidade sobre a Terra com a saúde do reverendo, além do mesmo escapar da morte com ajuda de uma mulher chamada Mary grávida de um menino.
   E mesmo deixando isso de lado, "First Reformed" atinge sucesso em ser o filme mais completo e diferente do ano até o momento por abranger de forma razoavelmente profundo tantos temas relevantes nos dias de hoje. Nota 10